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A CRISE HÍDRICA QUE NOS ATINGE EM CHEIO

A CRISE HÍDRICA QUE NOS ATINGE EM CHEIO

 

Falta de água, racionamento de energia, pandemia de Covid-19 e crise política: A tempestade perfeita não trará mais água para nos salvar da crise hídrica.

 

Comandar um navio por mares calmos é fácil. Quando a maré é plana, as ondas são baixas e os ventos são brisas os procedimentos padrões funcionam e as decisões se resumem a fazer o que já foi feito. No entanto um capitão é realmente testado quando se depara com uma tormenta, e se vê na obrigação de tomar decisões arriscadas, que às vezes salvam o navio, a tripulação e os passageiros, mas também pode fazer o barco naufragar e levar para o fundo da água todas as pessoas a bordo.

 

O Brasil lidera o ranking dos países mais ricos em água doce do mundo, com o total de 8.233 km³ de água própria para o consumo por ano. Mas, por mais irônico que possa parecer, a crise de falta de água no Brasil está fazendo o país mais rico em água doce do mundo naufragar. Os níveis dos principais sistemas reservatórios de água estão na cota mais baixa da sua história, e a sociedade já sofre os impactos desta situação, sendo que os cidadãos e os comerciantes são os mais afetados.

 

Há diversas explicações para a falta de água. A começar pela mais óbvia: às vezes chove pouco. Pouca chuva decorre de vários fatores, alguns deles dependentes do comportamento humano, outros nem tanto. É certo que reduzir a vegetação de uma região, impermeabilizar o solo, emitir gases que aceleram o efeito estufa e destruir a camada de ozônio provocam aquecimento global e, consequentemente, modificam as características pluviométricas de uma região. Segundo especialistas os efeitos do aquecimento global são óbvios, e estão ocorrendo muito antes e em intensidade muito maior do que era esperado, sendo que a tendência é que essa condição se torne mais grave e mais frequente a cada ano.

 

Lutar contra o aquecimento global é necessário, mas os efeitos dessa luta são de longo prazo, implicando na necessidade de repensarmos a forma como nos preparamos para estas oscilações. O princípio da solução ou prevenção de qualquer problema é o reconhecê-lo. Diversas ações poderiam ter sido tomadas para minimizar os efeitos da estiagem, algumas delas técnicas, outras administrativas, mas todas conhecidas e viáveis do ponto de vista executivo. Não nos cabe discutir os motivos que levaram à passividade das autoridades em relação a este problema, pois a raiz desta questão provavelmente reside em motivos políticos, coincidentes com as estratégias eleitorais que, infelizmente, são a maior prioridade dos governantes. No entanto é possível discutir as falhas na gestão do problema, e refletir sobre o aprendizado que esta situação calamitosa que vivemos.

 

Há soluções técnicas, mas dependem de vontade política

Embora o Brasil tenha a maior quantidade de água doce, a maior parte está concentrada na Amazônia, e num país com as nossas dimensões, a distribuição deste recurso é absolutamente heterogênea. Sobra água em alguns estados, enquanto falta em outros. Uma solução óbvia para escassez de água em algumas regiões é a uniformização da sua distribuição, que poderia ser obtida através da interligação dos sistemas de armazenamento. Isso já ocorre em alguns poucos casos, mas a ideia poderia se expandir para sistemas interestaduais, uma vez que a água é, em última análise e segundo algumas interpretações jurídicas, um recurso federal. Para manter este sistema funcionando de maneira justa e adequada seria necessário um sistema de controle eficiente, que gerenciaria a disponibilidade do recurso nas áreas em que ele é mais necessário, considerando a sua disponibilidade e consumo.

 

Outra solução técnica é o melhor aproveitamento da água de reuso. Já existe tecnologia suficiente para tratar a água para que ela se torne potável e adequada para o consumo humano, sendo necessária a implantação de estações de tratamento e o controle da eficácia destas estações. 

 

Apesar das soluções técnicas, o comportamento da população também é decisivo nesta equação, uma vez que o balanço hídrico considera a oferta e o consumo de recursos. Há dados que nos fazem supor que o consumo de água em São Paulo, por exemplo, aumentará aproximadamente 40% até 2030. Se isso se confirmar, mesmo que o sistema de reservatórios esteja completo, não haverá volume que supra estes níveis de consumo. Desta forma, é preciso tomar ações que visem a mudança de comportamento do consumidor, disseminando e fomentando o uso racional do recurso, mesmo em tempos de abundância.

 

Nuvens negras à frente (e não são de chuva)

Atualmente já vivemos a crise e soluções emergenciais estão sendo tomadas. Cedo ou tarde vai voltar a chover, e os reservatórios provavelmente ficarão em níveis aceitáveis. Resta saber qual será o nosso aprendizado a partir desta experiência. O nosso sistema de abastecimento estará preparado para novos períodos de crise? O nosso comportamento se adequará à nova realidade ou continuaremos esgotando os recursos disponíveis como nuvens de gafanhotos devorando uma plantação? Quais políticas públicas serão adotadas para fazer com que esse equilíbrio volte a se restabelecer e se mantenha de maneira perene? Até quando os interesses políticos serão mais importantes do que os interesses da sociedade? O elefante está na sala, e as respostas a estas perguntas são difíceis e inconvenientes, mas são essenciais entender e solucionar definitivamente este grave problema.


FLAVIO OLIVEIRA

flavio.oliveira@pmanalysis.com

 

 

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